Com um discurso focado no poder de compra e uma imagem moderada em comparação com o ultra Éric Zemmour, Marine Le Pen está prestes a realizar o sonho de décadas da extrema-direita: tornar-se presidente da França.
“Nunca estive tão perto da vitória”, disse no final de março o candidato de 53 anos ao Grupo Nacional (RN), que perdeu na segunda volta para o liberal Emmanuel Macron com 33,9% dos votos em 2017.
No entanto, a terceira vez pode ser o charme. De acordo com estimativas antecipadas, Le Pen conseguiria passar para a votação este domingo com entre 23,5% e 24,7% dos votos contra Macron (27,6% e 29,7%).
De acordo com as últimas sondagens de sexta-feira antes do primeiro turno, a liderança dos centristas no segundo turno de 24 de abril é reduzida para entre 2 e 8 pontos.
Se ela ganhasse as chaves do Eliseu, essa advogada coroaria com sucesso sua estratégia de apagar a imagem extremista do partido, já que em 2011 assumiu as rédeas da então Frente Nacional (FN), fundada por seu pai.
Jean-Marie Le Pen já atingiu o marco de contestar a balotagem em 2002, quando perdeu com quase 18% dos votos para o conservador Jacques Chirac, mas com uma imagem de um partido racista, antissemita e nostálgico para a Argélia colonial.
Marine Le Pen separou os membros proeminentes desses setores, incluindo seu pai, e outros se juntaram às fileiras de seu rival Éric Zemmour, que, segundo observadores, busca reviver a tradicional FN.
Suavizando sua imagem
“A mera presença de Éric Zemmour, percebida como mais radical do que ela tanto em substância quanto em forma, tem mecanicamente re-focado a imagem de Le Pen”, tuitou Mathieu Gallard, analista da Ipsos France, recentemente.
A candidata do RN também tem feito esforços para suavizar sua imagem para deixar para trás o acalorado cara a cara com Macron em 2017, no qual foi censurada por sua “agressividade” e “falta de preparação”.
Le Pen “joga bem e tira proveito disso. E, além disso, nos acostumamos a extremos”, lamentou o ministro da Agricultura próximo de Macron, Julien Denormandie, sobre a ascensão da candidata rival em sua terceira eleição presidencial.
O político nascido em 5 de agosto de 1968 em Neuilly-sur-Seine, uma cidade rica a oeste de Paris, visita mercados, escala tratores e dá entrevistas íntimas... para se diferenciar de Macron, percebido como “arrogante”.
Em entrevistas, ela também se apresenta frequentemente como agricultora, criadora de gatos, na tentativa de normalizar sua imagem e minar a “frente republicana” dos partidos contra ela no segundo turno, segundo relatório da Fundação Jean-Jaurès.
“Fundamentos da FN”
Sua campanha tem se concentrado em criticar o aumento dos preços da energia, em um contexto de medo sobre a perda de poder de compra, e em garantir que ele não vai empurrar a idade de aposentadoria para 65 como Macron propõe, mas para trazê-la até 60 em alguns casos.
No entanto, “seu programa dificilmente mudou dos fundamentos da FN, como imigração e identidade nacional”, disse recentemente à AFP Cécile Alduy, professora da Universidade Americana de Stanford.
Seus planos incluem conter a migração e combater a “ideologia islamista”: reservar benefícios sociais para os franceses, acabar com o reagrupamento familiar ou proibir o véu no espaço público, entre outras propostas.
“Mas ele escolheu um vocabulário diferente para justificá-lo: em nome do secularismo e dos valores republicanos, e até do feminismo”, acrescentou Alduy, especialista em discurso de extrema-direita.
Vestida com cores claras e sorrindo o tempo todo, ela optou por aparecer como a candidata à “paz civil” e à “unidade nacional”, e procura “fazer esquecer a dureza de seu programa”, segundo a Fundação Jean-Jaurès.
Marine Le Pen, uma loira de caráter firme e olhos claros, se apresenta como uma “mulher moderna” e solteira. Esta mãe de três filhos se divorciou duas vezes, se separou de seu último parceiro e mora com um amigo de infância que ela acolheu.
(Por Toni Cerdá, AFP)