Juan Fernández Hanco, defensor da Reserva Nacional de Tambopata, foi morto a tiros por assassinos, aparentemente contratados por máfias compostas por mineiros ilegais que ameaçam sua família há anos, denunciaram seu irmão e coordenador do Comitê de Gestão da Reserva, Germán Fernández.
Segundo Germán, ele estava na casa do irmão durante um evento quando um cara chegou e atirou nele duas vezes perto da cabeça. De acordo com sua versão, foram dois assassinos que estavam no local naquela noite. Ambos teriam sido contratados por pessoas ligadas à mineração ilegal. “Esses senhores são invasores. Assassinos contratados por mineiros ilegais. Enquanto a mineração ilegal estiver em Nueva Arequipa, todos os dias haverá mortes. Este lugar deve ser declarado emergência. As pessoas morrem aqui todos os dias”, disse.
Mas o assassinato de Fernández Hanco seria um aviso para a família, já que há duas semanas sua irmã foi sequestrada por pessoas ligadas a essas atividades ilegais enquanto ela estava na fazenda de sua família. A situação é tão grave que Germán e seu pai têm garantias para suas vidas, mas a vítima não tinha essa proteção. “Eles me ameaçam todos os dias. Eles vêm até a porta da minha casa e mandam tiros no ar (...) Sempre lutei contra a mineração ilegal em toda a zona tampão, mas não há controle lá. Há policiais que não trabalham, e é por isso que não conseguem tirá-los de lá”, acrescentou.
Para o defensor ambiental, Victor Zambrano, presidente do Comitê Gestor da Reserva Nacional de Tambopata, a situação em Madre de Dios está fora de controle, sem funcionários ou autoridades interessadas em oferecer qualquer solução para as atividades extrativistas que estão atacando a Amazônia florestas. “Aqui está mais um exemplo da indiferença que existe. Pessoas ilegais querem legalizar e as tratam como se fossem legais em La Pampa. Aqui, no Perú, nunca encontramos justiça. Temos que ir a órgãos internacionais”, explicou.
De acordo com a Sociedade Peruana de Direito Ambiental (SPDA), com o crime de Juan Fernández já existem 14 defensores ambientais mortos desde o início da pandemia. Esse número reúne casos relatados por organizações indígenas e pelo Estado peruano.
“O preocupante dessa situação é que Juan Julio é o terceiro defensor ambiental a ser morto em Madre de Dios. A impunidade com que os ilegais atuam em Tambopata continua a criar um contexto desafiador e mortal para aqueles que buscam defender suas terras e florestas porque são seus meios de subsistência, para que sua luta nunca pare”, disse Luisa Ríos, coordenadora regional do SPDA em Madre de Dios.
TABELA DE DEFENSORES AMBIENTAIS
Após este evento sangrento, o governo se comprometeu a promover uma Mesa Redonda de Defensores Ambientais em Madre de Dios, para articular ações com autoridades, organizações indígenas e sociedade civil, a fim de promover ambientes seguros para os defensores dos direitos humanos e reduzir situações de risco.
Isso foi relatado pelos Ministérios do Interior, Justiça e Meio Ambiente, em uma declaração conjunta após o assassinato do defensor ambiental Julio Fernández Hanco se tornar conhecido.
O comunicado afirma que o Ministério da Justiça e Direitos Humanos (Minjusdh) tomou conhecimento dos fatos e se colocou à disposição dos familiares da vítima. “Imediatamente, coordenou com o Ministério Público, o Ministério do Interior e outras autoridades locais, para o início de investigações relevantes e o pronto esclarecimento dos fatos”, acrescenta o documento.
O Ministério do Interior (Mininter), por sua vez, por meio da Polícia Nacional Peruana (PNP), está colaborando com o trabalho do Ministério Público nos procedimentos organizados como parte das investigações sobre a morte do defensor ambiental.
VIOLÊNCIA NÃO MEDIDA
A Public Eye, em um relatório especial, coleta dados do estudo “Última linha de defesa” da Global Witness, que estabelece que ao longo de 2020, 227 defensores ambientais foram mortos em 22 países ao redor do mundo. Desse total, três quartos dos ataques foram relatados na América Latina. Ou seja, 165 pessoas foram mortas na região por defenderem seu território.
Os países com mais assassinatos foram Colômbia (65), México (30), Filipinas (29), Brasil (20), Honduras (17), Congo (15), Guatemala (13), Nicarágua (12) e Perú (6).
Nos números acumulados, o Brasil é o país com mais vítimas, com 697 defensores mortos de 2002 a 2020, seguido pela Colômbia com 317 e as Filipinas com 293. O Perú relatou 96 casos na época.
Da mesma forma, o relatório sobre 'Clima de Mudanças' da Universidade Católica indica que a mineração ilegal e a mineração informal têm entre 300.000 e 1 milhão de pessoas envolvidas nessas atividades, que são distribuídas por todo o país.
“A mineração ilegal no Perú é um fenômeno que está aumentando a cada ano e as ações do Estado contra ela não são suficientes, mas há falta de regulamentação legal e falta de estratégias. Nesse sentido, a inação de políticas contra a mineração ilegal fez com que essa atividade ilegal continue aumentando e causando um atraso no cuidado e proteção do meio ambiente, além da violação dos direitos das pessoas que cercam os projetos”, acrescenta.
Em países como Venezuela, Colômbia, Equador, Perú, Brasil, Argentina e Bolívia, existem grandes áreas onde a mineração ilegal predou florestas; criou dragas; destruiu fontes de água; e envenenou solo e ar por causa de reagentes altamente tóxicos que, sem uso, tratamento e controle adequados, tiveram um impacto incalculável no meio ambiente.
De acordo com o Portal Mongabay, 2.312 sites com essa atividade ilegal foram identificados. Além disso, 245 áreas de mineração não autorizadas onde ouro, diamantes e coltan são extraídos.
Além disso, a inação do governo, a falta de vontade política ou conflito de interesses ceifou inúmeras vidas em Madre de Dios, além da predação de 100.000 hectares de floresta amazônica, poluição maciça, assassinatos e tráfico de trabalho e sexo de pessoas. Mais de 2 bilhões de euros em ouro são extraídos ilegalmente desta terra todos os anos.
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