Julgamentos suspensos e nenhum acusado de corrupção: a guerra judicial Venezuela-Odebrecht

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Três processos da Odebrecht contra a Venezuela foram suspensos este mês, enquanto o estado mantém um julgamento contra a construtora. Seis anos após a eclosão do escândalo de suborno da empresa brasileira, não há acusados de corrupção neste país sul-americano.

Sem explicações, o Supremo Tribunal de Justiça (TSJ) anunciou em seu site a suspensão “até novo aviso” das audiências dos três processos contra o segundo país que mais recebeu subornos da gigante da construção, cerca de US$98 milhões, segundo o ex-presidente Marcelo Odebrecht, condenado a 19 anos de prisão no Brasil.

Essas audiências foram agendadas de 10 a 17 de março.

Obras como a ponte do Mercosul, que ligaria os estados de Guárico (centro) e Bolívar (sul); uma segunda ponte sobre o lago Maracaibo, em Zulia (noroeste); e um sistema ferroviário para ligar Caracas com as vizinhas La Guaira e Guatire, ficaram inacabadas.

De um apartamento no rio Orinoco ou de um carro na rodovia ao sair de Caracas, você pode ver os gigantes pilares de concreto desses projetos abandonados.

A maioria foi acordada durante o governo do falecido ex-presidente Hugo Chávez (1999-2013), que fortaleceu as relações com o Brasil por Luiz Inácio Lula da Silva (Lula, 2003-2010) -também pontilhada por escândalo-, em meio a um boom do petróleo que terminou em 2014, com seu sucessor, Nicolás Maduro, no poder.

O escândalo da Odebrecht, que explodiu em 2016, envolveu políticos e funcionários de 12 países latino-americanos — incluindo presidentes e ex-presidentes — que receberam centenas de milhões de dólares em subornos em troca de contratos públicos no continente. Nenhum funcionário, ao contrário, foi acusado na Venezuela.

- “Ele nunca abandonou as obras” -

Depois que o escândalo estourou, o governo venezuelano suspendeu unilateralmente seus contratos com a Odebrecht e invadiu suas instalações.

Maduro diz que as obras foram “abandonadas ilegalmente pela Odebrecht”, o que a construtora nega.

A Odebrecht, que se tornou sinônimo de corrupção no continente e mudou seu nome para Novonor, exige que a decisão de suspender contratos seja anulada e permitida a conclusão das obras.

“É importante esclarecer que a CNO [Constructora Norberto Odebrecht] nunca abandonou as obras que estava realizando na Venezuela. O que aconteceu foi que todos os contratos de obras foram rescindidos unilateralmente pelos vários clientes estatais”, disse Novonor à AFP.

Segundo a ONG Transparencia Venezuela, houve uma cessação dos pagamentos de valorizações” em 2016, num momento de profunda crise, que “impossibilitou o trabalho”.

A Transparencia Venezuela indicou em 2018 que a Odebrecht concluiu apenas nove das 33 obras contratadas e que o Estado venezuelano havia pago ao conglomerado mais de US$13 bilhões por 18 delas.

A ex-procuradora-geral Luisa Ortega Díaz disse, fora do cargo, que esse valor na verdade chegou a US $30 bilhões.

- “Terra nos olhos” -

Maduro prometeu repetidamente que terminará os projetos da empresa brasileira, embora ainda não haja cronograma.

“A Odebrecht jogaria sujeira nos olhos de alguém, já que eles são os únicos que podem construir um elevado, uma torre, nós podemos fazer isso”, disse em cerimônia oficial em setembro passado.

Por seu lado, o ministro dos Transportes, Hipólito Abreu, declarou ao canal estatal VTV que todas as obras estavam “sem planos, sem desenhos”, pelo que começou um trabalho de “engenharia” e “reengenharia” para as completar agora.

Ao mesmo tempo, enquanto os processos da Odebrecht foram suspensos, um julgamento da estatal Metro de Caracas contra a construtora pelo não cumprimento de um projeto de 2.400 casas que também não foram construídas, com investimento de 76 milhões de dólares, de acordo com acórdãos do TSJ.

O mais alto tribunal venezuelano, cuja última decisão sobre o caso foi em setembro passado, pediu esclarecimentos e avalia evidências.

O ex-presidente brasileiro Lula foi condenado no caso Odebrecht, embora sua sentença tenha sido anulada. O ex-vice-presidente do Equador Jorge Glas e o ex-ministro das Obras da República Dominicana Victor Díaz Rúa também foram condenados à prisão, já que o ex-presidente peruano Ollanta Humala enfrenta julgamento.

Nada disso acontece na Venezuela. O procurador-geral Tarek William Saab disse em entrevista à AFP em 2017 que as alegações seriam investigadas e descartou a abertura de um arquivo contra Maduro, acusado por seu antecessor no Ministério Público.

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