A ruptura pessoal entre Alberto Fernández e Cristina Kirchner complica a agenda política e econômica do governo

O presidente e o vice-presidente não conversam entre si e toda a administração da Casa Rosada ficou sob o fogo cruzado de um preso palaciano que começaria a ser resolvido após o primeiro desembolso do FMI.

Argentina's President Alberto Fernandez looks at Vice President Cristina Fernandez de Kirchner outside the National Congress during the opening session of the legislative term for 2022, in Buenos Aires, Argentina March 1, 2022. Natacha Pisarenko/Pool via REUTERS

Durante sessenta dias, Alberto Fernández já tomou todas as decisões-chave do Governo sem consultar Cristina Kirchner, que decidiu vir, chateada e irritada, por causa do tom e do conteúdo das negociações que Martín Guzmán realizou em janeiro com a equipe da o Fundo Monetário Internacional (FMI).

O vice-presidente não compartilhou a estratégia do presidente e seu ministro da Economia com o Fundo e decidiu realizar um recuo tático enquanto se aguarda um resultado político que ela acredita ser viável: o fracasso do acordo com o FMI e seu subsequente palaciano vingança.

Neste contexto político, então um segredo de estado, Máximo Kirchner renunciou ao presidente do bloco de deputados e CFK manteve seu silêncio público sobre as conversações de Guzmán para chegar ao Acordo de Pessoal que agora será endossado pelo Senado com uma maioria robusta e multipartidária.

Com a ruptura exposta dentro do Palácio, Alberto Fernández manteve as formas para evitar que a ruptura se tornasse uma crise de governança. De Pequim, China, o presidente disse a Cristina como foram seus encontros com Vladimir Putin e Xi Jinping, e dias depois ele deixou uma mensagem para ela no aniversário dela.

Pura formalidade. Diante das ligações de Alberto Fernández, a conversa usual de CFK se transformou em uma sucessão fria de monossílabos que acabou terminando em sua decisão política de ignorar as mensagens que recebeu de sua conta do WhatsApp e Telegram para descobrir como ele estava depois de sofrer agressão fascista em seu gabinete no Senado.

Gabriela Cerrutti prepara suas palestras de quinta-feira. Ajuste os detalhes com Alberto Fernández e escreva pessoalmente a apresentação que ele fará aos jornalistas da Casa Rosada. Nessa perspectiva, foi uma decisão política que a porta-voz confirmará - em público - que a relação pessoal entre o presidente e o vice-presidente não existe mais.

Alberto Fernández tem uma agenda marcada pela votação do acordo com o FMI na Câmara Alta, os anúncios de lançamento da guerra contra a inflação em Tucumán e os desembolsos que o Fundo deve fazer para evitar a inadimplência em março. E uma vez cumpridas essas etapas, o presidente já terá tomado uma decisão que marcará seus últimos dois anos de mandato presidencial.

Essa importante decisão política precisava do reconhecimento oficial da porta-voz Cerrutti. O chefe de Estado reconhece em privacidade que a CFK fugiu de decisões-chave, e seus aliados nas câmaras municipais, Congresso, sindicatos, movimentos sociais e províncias, exigiram um sinal de poder anunciando que a licitação final havia começado.

“A presidente se comunicou, sem ter respostas, com a vice-presidente, bem como com sua secretária particular”, confirmou Cerrutti quando questionado na conferência de imprensa se era verdade que a CFK não havia respondido às mensagens de WhatsApp e Telegram de Alberto Fernández.

Era o sinal político que os aliados do presidente estavam esperando.

Alberto Fernández espera que a posição de Cristina e Máximo tenha uma forte derrota no Senado e está preparando um pacote de medidas econômicas que não são consultadas com o vice-presidente e o líder da Campora. Eles têm as informações de seus ministros e secretários leais, mas estão à margem de todas as decisões políticas.

No entanto, CFK e Máximo administram muitos espaços de poder na administração pública, no Congresso e nas câmaras municipais. Esse poder é forte o suficiente para interferir nas decisões tomadas por Alberto Fernández e seus próprios ministros.

A inflação atinge os setores mais atingidos e a guerra na Ucrânia agrava a situação na Argentina. O presidente ainda explora o que fazer para evitar que a desintegração da Frente de Todos multiplique a crise econômica e social.

Na Casa Rosada, duas opções são analisadas com sua própria explicação: razzia política ou coexistência pacífica simulada.